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Teletrabalho - Acordos podem ser revistos por causa da energia

Teletrabalho - Acordos podem ser revistos por causa da energia

Despesas: Empresas definiram valores fixos mensais para comparticipar custos do teletrabalho. Mas lei é soberana: se o valor definido não cobrir as despesas, trabalhadores podem exigir reembolso, como consta no Código do Trabalho

08.04.2022 | Por Cátia Mateus


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A escalada dos custos da energia pode colocar um desafio acrescido às empresas com profissionais em regime de teletrabalho. Para ultrapassar a complexidade da lei no cálculo da comparticipação pelo acréscimo de encargos decorrentes do teletrabalho, muitas organizações optaram por definir um valor fixo mensal a atribuir aos profissionais. Problema? Estes acordos foram firmados em janeiro deste ano, antes da escalada de preços da energia, e os montantes então definidos podem agora não cobrir o aumento real de encargos que resulta para o trabalhador. Advogados ouvidos pelo Expresso sinalizam que a lei prevê a comparticipação total do aumento de custos que se prove decorrerem do trabalho remoto, e por isso, mesmo com um acordo a fixar um valor mensal, se este for insuficiente, o trabalhador pode exigir o pagamento de despesas tal como consta da lei.

Não é fácil aplicar a lei no que toca à comparticipação de despesas do teletrabalho. Desde 1 de janeiro deste ano que o empregador está obrigado a compensar o trabalhador pelo aumento de custos com energia e comunicações que se prove resultarem do teletrabalho. Esta compensação, determina o Código do Trabalho, é calculada tendo como referência o período homólogo e mediante a apresentação mensal dos respetivos comprovativos. “Um processo burocrático que não só levanta várias questões operacionais relacionadas com a verificação mensal de faturas e respetivos cálculos como também coloca problemas de prova”, recorda Pedro da Quitéria Faria, sócio da Antas da Cunha Ecija.

Em causa estão, por exemplo, questões práticas relacionadas com o cálculo de custos quando dois empregados de empresas distintas estão em teletrabalho na mesma residência ou quando há dependentes em ensino remoto, a delimitação do uso de energia para lazer ou ainda como se faz a prova quando o contrato não está em nome do funcionário. Para ultrapassar estas questões e agilizar o processo grande parte das empresas optou por estabelecer acordos de teletrabalho definindo um valor fixo mensal para a comparticipação de despesas. Mas a solução também não está isenta de problemas, admitem os advogados.

Além da dificuldade em enquadrar contabilisticamente estas despesas — porque, apesar de a lei determinar que a compensação paga “é considerada, para efeitos fiscais, custo para o empregador e não constitui rendimento do trabalhador”, não há regulamentação específica a determinar como se enquadram contabilisticamente despesas que não estão em nome da empresa ou até do próprio trabalhador —, a definição de um valor fixo pode não cobrir o acréscimo real de custos e o trabalhador sair prejudicado.

Contas difíceis

É o que pode acontecer no contexto atual se os custos de energia continuarem a aumentar. A maioria destes acordos prevê compensações em torno dos €15 a €30 mensais, valores definidos no início do ano, numa altura em que a pressão nos custos de energia era menor. E o que fazer nestes casos, quando o valor fixado pela empresa não chega para cobrir o aumento de encargos para o trabalhador? “Esse é precisamente um dos problemas destes acordos”, sinaliza Madalena Caldeira, da Abreu Advogados, acrescentando que, “se o trabalhador tem uma despesa efetiva que é superior ao montante do acordo, pode reclamá-la junto do empregador, mesmo que exista um acordo firmado entre as partes que estipule um valor fixo”.

Américo Oliveira Fragoso, advogado especialista em direito laboral da sociedade Vieira de Almeida, confirma: “Nenhum acordo se sobrepõe à lei.” O advogado vinca que “num cenário em que há despesas que continuam a aumentar, e em que o trabalhador consiga provar que decorrem do teletrabalho, não vejo que a vontade das partes se possa sobrepor ao estipulado na lei”.

Os advogados admitem, contudo, que o processo de reclamar o montante de despesa que exceda o valor definido no acordo da empresa, embora não tenha um prazo definido, não é de fácil prova. “O trabalhador terá de provar que há um acréscimo de custos e que o valor definido por acordo não é suficiente para o cobrir”, explica Pedro da Quitéria Faria, que nota: “Isto é válido mesmo quando no acordo conste que o trabalhador prescinde de outros créditos ao receber aquele valor.” Isto porque, da mesma forma que o trabalhador é chamado a provar as despesas e a insuficiência do montante fixo acordado com a empresa, esta “terá também de explicar qual foi o referencial que esteve na base da definição daquele valor. Se as premissas se alteraram, há lugar a compensação”. Contas que, admite, são complexas, constituindo uma prova “quase diabólica”.

Américo Oliveira Fragoso assume que muitas empresas que avançaram com a definição de montantes fixos para comparticipação de despesas com o teletrabalho possam, caso se mantenha a subida dos custos de energia, renegociar o montante dos acordos, que, diz, “é uma via mais simples do que a litigância”. No entanto, alerta: “Estes acordos, embora simplifiquem muito a aplicação da lei, não materializam o espírito do legislador, que prevê a compensação total do acréscimo de encargos mediante a apresentação de prova.” Ou seja, “ao avançarem para acordos desta natureza, as empresas estão sempre sujeitas à contestação do trabalhador, que pode, a qualquer momento, querer o pagamento conforme a lei”. E os trabalhadores, reconhece, podem até exigir da empresa o cumprimento escrupuloso da lei — o pagamento mediante prova de aumento de custos — e recusar uma proposta de acordo que fixe um valor fixo para despesas.



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